Impertinências com a imprensa brasileira

Elio Gaspari

Email ao Ombudsman da Folha de São Paulo, jan/2007

Gosto muito do Elio Gaspari, mas às vezes ler sua coluna é um exercício de advinhação, um joguinho de esconde-esconde onde o colunista parece ficar “piscando” pros seus leitores que, ou possuem o código, uns privilegiados, ou são como eu, e  ficam com a sensação de que estão bancando os  bobinhos do jogo.

Vejamos a nota “Guichê” de domingo, 21/01/07:  um “conhecedor” (quem? ok,  é “em off”. Esta passa)  viu “movimentos” de figuras do PP e hierarcas da Petrobras (quais? aqui já caberiam nomes). E que “movimentos” são estes? Oferecem dinheiro? Quanto? Pra quem? É só conversa? Não sabemos…

E chega o próximo parágrafo, este só para iniciados: “não soube se houve preferência pela paisagem do Recreio dos Bandeirantes ou se houve outra coisa…” Sic! Neste caso, temos um  mundo de possibilidades tão grandes quanto a extensão da Macumba ao Pepê (só para brincar com as deixas que  o colunista gosta tanto de usar, mas que só agradam aos mais chegados. Neste caso, o pessoal aqui do Rio sabe que eu quis apenas dizer que são vastas as possibilidades).

Resumindo: pra quem o Elio escreve? Pra patotinha que se diverte e liga pra ele de volta dizendo que “matou” a charada? Mas isso é meio desrespeitoso com todo o resto que não pode checar, certo? Nós que ficamos de fora, olhando uns pras caras atônitas dos outros nos perguntanto: você entendeu? Eu não…  e você? Também não…. Eremildo, o idiota, somos nós, seus leitores.

Continuo achando o Elio um excelente jornalista, mas será que ele pode parar um pouco com estas coisas, descer do pedestal de “monstro sagrado do jornalismo brasileiro” (merecido, claro) e, de quando em vez, escrever feito jornalista que precisa ser compreendido pelos seus leitores, não por seus fãs de carteirinha? A escumalha agradece.

Rio, 22/01/2007

Impertinências com a imprensa brasileira

Clovis Rossi e Jânio de Freitas

Email ao Ombudsman da Folha de São Paulo, maio/07

Assino a folha desde 1989 e observo seus altos e baixos há tempos. Dentre eles, um movimento recente vem me chamando a atenção: a qualidade da produção de duas de suas principais “estrelas”, membros inclusive do Conselho Editorial: Clovis Rossi e Jânio de Freitas, produção esta temperada pela novidade, de 2003 pra cá, de um governo petista. Ambos, acertadamente críticos deste governo. Mas  o primeiro se parece cada vez mais com um tiozão ranheta, produzindo muito pouco jornalismo e abundante irrelevância em seus comentários, e o segundo se firmando como a mais lúcida voz da Folha e por extensão, do jornalismo brasileiro.

Clovis Rossi deveria ser deslocado definitivamente para a reportagem. As que produz são excelentes. Mas como colunista, limita-se a um cotidiano exercício de busca de deslizes do governo, como alguém que cata pulgas, tarefa com a qual Lula e o PT colaboram abundantemente, diga-se. Adora apontar o dedo nitidamente magoado. Mas isso é muito pouco para alguém com a sua experiência e muito fácil em se tratando de um governo pródigo em vacuidade.

Clovis, nitidamente muito mais preocupado com a condição particular de uma classe que já não dirige tranqüila em São Paulo e que teme pelos netos, parece de vez em quando que escreve na Veja e para o público de Veja: um grupo que se leva muito em boa conta e que posa indignado com o país e seu governo, mas como se isso fosse novidade lulista.  Ok, Lula passou a vida toda falando o contrário e quando chega lá, faz tudo diferente, é verdade, isto irrita. Mas irritação não combina com lucidez: fomos ludibriados como sempre no geral; a novidade em termos de engodo ocorreu na ética prometida e não entregue (os outros governos se limitavam a não entregar, dado que não prometiam com especial ênfase), mas Lula e o PT só repetiram nossa grotesca história. No entanto, o Rossi prefere se sentir magoado e reclamar feito um marido traído, desavisado e sentimental.

No domingo, dia 13/05/2007, se comprazia em apontar uma aparente contradição da Ministra Dilma quando esta comparava o PAC com outros programas do passado. Lembrou-nos o colunista que neste mandato o próprio Lula disse que não mais se compararia com outros, mas com ele mesmo. A Dilma aparentemente não seguiu a ordem do chefe, apontava Rossi. E este seguiu digladiando-se com o fato de que ou o PAC dá 100%, ou então 60%, 70% de realização seria admissão de mediocridade (tenho certeza de que o Clovis sabe que isso é um exagero). Eu me pergunto: e então? Lula falou besteira de novo? A Ministra não prestou atenção? Se o Clovis estivesse lá na apresentação do PAC ele apontaria este fato para a Ministra? Claro que não! Ele sabe que isto é irrelevante, mas ele escreve: não resiste em se perder no detalhe do que seria uma falta de combinação de discurso entre chefe e subordinado. E este foi só o exemplo que escolhi para comentar. O padrão se repete com muita regularidade em sua coluna.

Jânio de Freitas é sempre relevante.Vai contra a corrente tanto da oposição quanto da situação. Tem a lucidez de quem olha para as coisas com distanciamento. Erra, acerta e sabe disso, mas é sempre relevante. Vejam sua coluna de hoje, 17/05/2007, sobre  a entrevista presidencial. Enquanto que quase a imprensa em coro enaltece  a desenvoltura de Lula, e até estranha porque ele não fala mais, já que se sai tão bem, Jânio tira os véus: perfeita a comparação com o  esnobismo, a marquetagem e o triunfalismo oco da era Collor. E sobra pro Serra também. Quase sempre sua coluna vai ao ponto, dificilmente se perde no dispensável.

Dou um desconto pro Rossi porque tem que escrever todo santo dia naquele espacinho no qual se espremem 4 colunas, 2 editoriais,  a charge e as frases! Fica difícil mesmo produzir algo além de reclamações e ritornelos. O Jânio tem mais tempo e espaço para depurar.

(Aliás, a página 2 da Folha foi a que mais sofreu com a reforma gráfica. Se compararmos com o Estado, Valor, O Globo e Gazeta, a Folha é o jornal que mais dificuldades impõe aos seus colunistas, principalmente pra quem escreve ali na página 2. Vocês criam problemas para si mesmos e levam junto profissionais que nitidamente podem produzir melhor.)

Mas isso não é o essencial: Clovis Rossi e Jânio de Freitas tomaram rumos diferentes, pena que o primeiro parece se perder no seu.

Rio, maio de 2007